sábado, 11 de fevereiro de 2012

Os iditoas - Idioterne.




Nas profundezas da alma do homem, deve existir um turbilhão de sentimentos esperando para serem atingidos. São poucos os momentos de nossas vidas onde nos sentimos imersos em sensações do espírito, da alma e do coração. Momentos estes, aliás, muitas vezes nos fazem refletir sobre nossas próprias condições enquanto seres humanos racionais – certo, nem sempre o somos, mas dar-se asas a imaginação quando falamos em sentimentos para o bem. Atestamos tudo que de ruim a natureza nos provém e quase sempre deixamos de lado nossas próprias convicções – muitas delas roubadas de nós ainda quando crianças, por meio de coisas que pouco importam realmente. Quando paramos para pensar e refletir sobre o que acontece a nossa volta, percebemos que os problemas que tanto tentamos corrigir, na verdade não são os maiores problemas que enfrentamos. Neste caso, bom é assistir um filme como Os Idiotas, do cineasta dinamarquês Lars Von Trier.

Apesar do testamento em celulóide de Trier ser de alguma forma argumentativo, autoral e filosófico, Os Idiotas não é um filme de fácil digestão. O viés artístico do projeto de cinema do diretor é contraposto a todo instante, quase sempre em prol de planos simbólicos e gélidos, mas nunca em função da manipulação dos sentimentos do espectador e do vazio completo de produções dramáticas. Trier, a bem da verdade, atingiu o limite daquilo que consideramos heróico e corajoso. Aliás, em certas sequências, parece um pouco exagerado, fora órbita, mas nada que atrapalhe o incrível fluxo de boas intenções da câmera do diretor. Boas porque mostram aquilo que todas as pessoas já sabem, mas que ainda insistem negar a si mesmas, e Trier não se esconde debaixo da saia mamãe Hollywood. Obviamente, o filme pode parecer ofensivo para determinados grupos, afinal o diretor conduz seu filme como quem conduz uma ópera, excluído de pudor e piedade. Vai do choque cultural ao sentimento comum a todos sem parar para ir ao banheiro, e o faz com extrema elegância através de suas câmeras digitais tremidas.

O filme mostra o cotidiano de um grupo de intelectuais que, certamente cansados da sociedade em que vivem, resolvem idiotizar a tudo e a todos, inclusive eles próprios, fazendo-se de deficientes mentais. Desde restaurantes até clubes aquáticos, passando por fábricas e lojas de conveniência, e até em suas próprias residências, os personagens procuram todos os lugares onde possam se revelar idiotas. Seguindo as regras do movimento Dogma 95 (criado por Trier e Thomas Vinterberg, que preza um cinema menos comercial, mais simples, sem adereços tecnológicos em nenhum dos setores do processo de filmagem, diferente do padrão hollywoodiano atual e antes da exploração industrial), Trier fez um filme discursivo, de estofo visual e auditivo.

O padrão de filmagem de Os Idiotas é o mais simples possível, capturado totalmente por câmeras digitais, munido de trilha sonora ambiente e iluminado somente com luzes naturais. Isso tudo, aliado ao poder de fogo que a trepidação dos movimentos de câmera alcança, atinge o espectador com mais força, mais realismo. A sensação durante a projeção é de impotência, aflição, angústia. Trier consegue jogar com os sentidos do público com destreza impressionante, colocando-se entre o absurdo e o necessário em doses iguais. Algumas cenas, aliás, atestam a peculiaridade do diretor, como quando os idiotas fazem uma orgia no meio da sala da casa do tio de um deles, que é residência temporária de todos. O cineasta filma tudo, com cortes para ângulos nada convencionais e enquadra uma penetração claramente. Trier soube o momento certo do corte nesta cena, que em questão de segundos poderia se transformar em pornográfica.

Há outras, como o momento onde o pai de uma personagem aparece de surpresa no local para levar sua filha para casa. Aqui a câmera posiciona-se a favor da mulher que sofre por ter que deixar os amigos que estava começando a gostar. Uma cena muito bem concebida pelo diretor, talvez a mais pesada psicologicamente do filme, onde se mistura família e amigos. Há encenação sim, mas os movimentos dos atores, sempre naturais, sem preocupação em manter-se no quadro, facilita a aproximação do espectador, apesar de muitas vezes essa aproximação não ser bem-vinda - tamanha inescrupulosidade de algumas sequências. Via de regra, Os Idiotas, segundo filme do movimento Dogma 95, consegue transmitir as ideias malucas do homem sentado na cadeira de diretor. Lars von Trier causou todas as sensações no público, inclusive nos que não gostaram do filme.

Questionando o modo de vida hipócrita, Stoffer e sua turma partem em busca de ideais utópicos, através do anarquismo. A crueza com que Trier trata das imagens e dos diálogos é tanta que muitas vezes não sabemos se estamos ou não assistindo um filme de ficção. O visual é sujo e a imagem, rebuscada. Isso pode ser um artifício atuando em prol do filme, já que este trabalha com uma temática suja, manchada de sangue e corrupção.




Título original: Idioterne, 
Lançamento: 1998 (Dinamarca)
Direção: Lars von Trier
Roteiro: Lars vo Trier

Atores:Duração: 1:57 minutos
Gênero: Comédia
Atores: Jens Albinus, Bodil Jorgensen, Anne Louise Hassing, Troels Lyby, Nicolaj Lie Kaas e Louise Mieritz
Status: Arquivado

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